AE - Agência Estado
Ao anunciar no dia 19 uma força-tarefa para propor leis e medidas que evitem
massacres nos EUA, o presidente americano, Barack Obama, foi colocado contra a
parede. Um repórter o lembrou que ele não fez nada para renovar a proibição de
venda de armas de assalto e disse que Newtown, a matança mais recente, não foi a
única nos últimos quatro anos. "Onde o senhor estava?", questionou o
jornalista.
Obama respondeu, visivelmente irritado, que não tinha passado quatro anos "de
férias". Ele explicou ter enfrentado a pior recessão desde os anos 30, o risco
de colapso da indústria automotiva e duas guerras. Todos esses desafios, de
fato, roubaram-lhe a atenção nos dois primeiros anos de governo. Nos dois
últimos, quando a campanha pela reeleição tomou conta da agenda, dois massacres
chocaram o país.
A reação mais vigorosa de Obama surgiu apenas depois de Newtown, onde 20
crianças de 6 e 7 anos e 6 adultos foram assassinados em uma escola. Adam Lanza,
de 20 anos, matara sua mãe minutos antes e se suicidou ao perceber que a polícia
se aproximava.
Obama ficou consternado com o massacre, enxugando lágrimas enquanto
discursava aos jornalistas horas depois da tragédia. Ao contrário de sua posição
em outros massacres ao longo de seu governo, ele foi adiante e prometeu "medidas
significativas", criou a força-tarefa e deu seu apoio à proibição de venda de
armas de assalto. O motivo da mudança: ele já estava reeleito.
Obama não reagiu dessa mesma maneira nem quando sua aliada, a deputada
democrata Gabrielle Giffords, do Arizona, foi gravemente ferida em um ataque
armado em Tucson, em janeiro de 2011. Na ocasião, ele insistiu na promessa de
ajudar as investigações e não mencionou medidas para combater esse tipo de
violência frequente no país.
Em momento delicado de sua campanha pela reeleição, em julho, Obama declarou
ter ficado "desolado" com a notícia do massacre no cinema de Aurora. Novamente,
ateve-se à punição dos culpados. O discurso não foi diferente, 16 dias depois,
quando seis pessoas foram assassinadas em um templo sikh em Oak Creek,
Wisconsin.
Durante a campanha presidencial, a questão do controle de armas foi
propositadamente colocada de lado, mesmo com os massacres de Aurora e de Oak
Creek.
''Longa tradição''
Apenas no debate realizado na Hofstra University, em outubro, o silêncio foi
quebrado pela eleitora Nina González. "O que o seu governo fez ou planeja fazer
para limitar o acesso a armas de assalto?", questionou ela a Obama.
Em sua resposta, ele deixou claro o limite de qualquer ação. "Você sabe, nós
somos uma nação que acredita na Segunda Emenda. E eu acredito na Segunda Emenda.
Como você sabe, nós temos uma longa tradição de caça", afirmou.
A Segunda Emenda foi adotada em 1791 para dar o direito ao porte de armas aos
civis, que organizavam milícias para a proteção das comunidades. Em 2008 e em
2010, a Corte Suprema decidiu que ela garantia também o direito de uso de armas
para a autodefesa.
Obama era professor de direito constitucional na Universidade de Chicago
antes de ingressar na carreira política. Sabe que mudar um artigo da
Constituição exige um trabalho hercúleo: dois terços de aprovação nas duas Casas
do Congresso e dois terços dos parlamentos estaduais.
O presidente também conhece os dados das mais recentes pesquisas, nas quais
os americanos reconheceram haver algo errado na sociedade e apoiaram as
restrições ao acesso às armas, mas não aceitaram mudanças na Constituição. Ele
também está ciente do poder do lobby político da Associação Nacional do Rifle
nos dois partidos e de seu respaldo entre os eleitores, especialmente os de
homens brancos do Meio-oeste, entusiastas da caça e da autodefesa.
Ainda assim, o esforço para a mudança na Constituição poderia estar entre as
prioridades de um presidente em seu último mandato, como a prometida reforma da
legislação sobre imigração. Obama já não precisa se preocupar com custos
eleitorais nos próximos quatro anos. Sua história de defensor do controle de
armas, porém, mudou desde que atuava como ativista político em Chicago.
Em 2008, já candidato à Casa Branca, Obama avisou: "Eu não vou tomar as suas
armas". Como líder dos EUA, ele não foi apenas omisso diante das cinco tragédias
ocorridas até o momento. Enquanto o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg,
pressionava o governo federal a adotar medidas de controle, Obama aprovava o uso
de armas em parques nacionais.
A amplitude da lei de restrição da venda de armas de assalto e de munição de
alto poder de destruição, se vier a ser apresentada e apoiada pelo governo,
deverá ser avaliada com lupa. A lei que bania a venda desse armamento, vigente
entre 1994 e 2004, não foi retroativa. Quem possuía esses modelos pôde mantê-los
e os que foram fabricados antes da sanção da lei puderam ser revendidos. As
informações são do jornal O Estado de S. Paulo.