McCain poderá ser um Truman?
Uma reportagem do "Washington Post" especulou ontem sobre perguntas que atormentam os dois candidatos presidenciais dos EUA, o eleitorado do país e muita gente mais pelo mundo afora. Os dados apurados nas numerosas pesquisas (nunca houve tantas numa eleição) estarão realmente corretos? Ou elas podem estar erradas?
Como todas as pesquisas são desfavoráveis ao candidato republicano, parece natural a campanha de John McCain e seus aliados acharem que estão erradas. "Nós acreditamos que é uma disputa muito apertada e, com franqueza, achamos que podemos vencer", disse ao "Post" a diretora de estratégia da campanha republicana, Sarah Simmons.
McCain e sua gente sugerem até que o país está a caminho de uma nova versão da reviravolta de 1948, só que com o candidato republicano no papel desempenhado naquele ano pelo presidente democrata Harry Truman. Dado como sem chance na véspera da eleição de 1948, Truman festejou a vitória no dia seguinte rindo do "Chicago Daily Tribune", que noticiava em manchete a derrota dele.
A grande surpresa de 1948
Mas 60 anos fazem diferença. As técnicas de pesquisa evoluiram e o quadro político é outro, completamente distinto. Como vice de Franklin Roosevelt, Truman assumiu em seguida à sua morte, em abril de 1945, a dias no final da guerra na Europa. Truman, obscuro, quieto, sequer fora informado pelo presidente que a bomba atômica estava sendo construída e seria testada em julho.
Quando decidiu candidatar-se à reeleição, Truman ainda viu seu Partido Democrata ser despedaçado. À esquerda, Henry Wallace, que fora vice de Roosevelt antes dele, lançou-se pelo Partido Progressista, como herdeiro legítimo do New Deal. E à direita o segregacionista Strom Thurmond criou o Partido dos Direitos dos Estados para tirar votos de Truman no sul racista.
Tudo aquilo ajudava o republicano Tom Dewey. A eleição parecia mera formalidade. Mas veio a guerra fria. Truman endureceu para recuperar o eleitorado do sul, lançou a doutrina Truman e o plano Marshall, assumiu estatura presidencial. Wallace começou forte, com apoio dos comunistas. O agravamento da situação internacional destruiu sua imagem rooseveltiana.
As técnicas de pesquisa talvez tenham sido insuficientes para acompanhar tantas mudanças em 1948. Atualmente, a própria multiplicidade de pesquisas e de organizações de pesquisas permitem análise mais sofisticada. Segundo observou há dias um analista da televisão americana, em nenhuma campanha presidencial houve tantas pesquisas como na deste ano.
A vantagem que encolheu
Num curto espaço de semanas, disse ele, foram cerca de 170 pesquisas. E desde a primeira quinzena de setembro, praticamente nenhuma apontou vantagem real para o republicano McCain. Obama passou a ganhar em todas. Só que a vantagem sempre variou. Atualmente varia entre dois (como medido pela Gallup ontem, para votantes prováveis) e 15 pontos percentuais.
A última pesquisa do "Washington Post" com a rede ABC de televisão apontou sete pontos percentuais de vantagem para o democrata, 52% a 45%. Na campanha de McCain, disse o "Post", alega-se que as pesquisas com vantagens maiores para Obama presumem que o comparecimento dos eleitores jovens e dos negros será desproporcionalmente elevado - e não contam com grande comparecimento dos republicanos.
Se isso for verdade, as pesquisas de fato poderão ser atropeladas. Mas é difícil acreditar na hipótese, já que são tantas organizações especializadas envolvidas. E há ainda outro lado nesse trabalho. O "Post" citou a pergunta que o ex-secretário da Defesa Rumsfeld costuma fazer em contexto diferente: "Quais os `desconhecidos não conhecidos' sobre a pesquisa este ano?"
Por exemplo, as pessoas este ano que não respondem a entrevistadores são mais inclinadas para os republicanos? Talvez elas queiram esconder do entrevistador que não votarão em Obama, nome da moda. Assim, a pesquisa subestimaria votos favoráveis a McCain. Ao falar disso, Steven Schier, cientista político do Carleton College de Minnesota, disse ao "Post" haver 25% de chance de ser a eleição apertada e McCain ganhar.
A decisão no Colégio Eleitoral
Outros especialistas também vêem a possibilidade de surpresa de última hora. E embora o chamado "efeito Bradley" não esteja sendo muito discutido (para alguns, há explicações mais sofisticadas, que o aceitam sem lhe dar o peso antribuído antes) ele nunca chega a ser totalmente desprezado.
Em meio a tudo isso, os analistas ainda têm de considerar que as pesquisas nacionais são prejudicadas pelo fato de não ser a eleição decidida pela votação popular e sim pelo Colégio Eleitoral. O que as pesquisas avaliam diariamente, a não ser quando limitadas a estados, é uma votação que não apontará o vencedor.
Nas estimativas sobre o Colégio Eleitoral, expostas todo dia em vários websites (entre eles os da CNN, do "Los Angeles Times" e do Politico.com) a vantagem de Obama parece maior do que nas pesquisas da votação popular. Ontem, o "Los Angeles Times" dava 318 votos para Obama, 174 para McCain e 46 ainda sem definição; a CNN, 286 Obama, 163 McCain e 89 não definidos. E o Politico.com, 375 Obama, 163 McCain e 141 indecisos.
Nos três mapas Obama ultrapassa os 270 votos necessários para ganhar e McCain precisa ganhar todos os indecisos e tomar alguns dos "inclinados para Obama". Parece vitória certa de Obama no Colégio Eleitoral. A menos que venha uma onda - ou tsunami - nos próximos dias, capaz de mudar tudo. Não que seja impossível. Mas haveria mais fatores a considerar, inclusive que 18% dos eleitores já votaram