sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Golpe é receita de McCain para a AL (Argemiro Ferreira)

Se alguém ainda duvidava de que um governo republicano de John McCain será apenas "more of the same" - ou seja, "mais do mesmo", um terceiro mandato de George Bush - devemos a "O Globo" o mérito de, sem querer e sem sequer perceber, ter confirmado a suspeita. O jornal entrevistou Otto J. Reich, um lobista daquelas dezenas da tropa que tomou de assalto a campanha de McCain.

Profundamente lamentável, no entanto, é o jornal dos irmãos Marinho ter optado por omitir os antecedentes do entrevistado - o que colocaria a matéria no contexto e a tornaria relevante. Ao integrar-se ao contingente lobista da campanha, Otto Reich levou sua larga experiência a serviço da Ron Bacardi, indústrias de armas e fábricas de cigarro, mais o trabalho sórdido de disseminar mentiras em veículos da mídia.

Como cultor dessa última prática subterrânea e golpista, ele foi pilhado pela investigação do escândalo Irã-Contras e acusado de "propaganda clandestina" contra países da América Latina. Textos fabricados e "plantados" por ele na mídia dos EUA eram depois usados pelo governo Reagan no Congresso como "provas" da necessidade de operações ilegais como a guerra secreta contra a Nicarágua.
Do complô golpista ao terrorismo

Tendo agido inicialmente na Usaid, no começo do primeiro mandato de Reagan, Reich deslocou-se em 1983 para o Escritório de Diplomacia Pública (OPD), a cargo de operações de mídia relacionadas à América Latina e Caribe. Apesar de subordinado ao Departamento de Estado, o OPD prestava-se a patrocinar as ações ilegais dele - "propaganda encoberta" dentro dos EUA, a serviço da CIA e do coronel Oliver North, então no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca.

Tanto North, figura central do escândalo Irã-Contras, como o secretário adjunto para a América Latina no Departamento de Estado, Elliott Abrams, seriam depois condenados na Justiça pelas ilegalidades. Reich, apesar de atolado na lambança, ainda passou três anos como embaixador na Venezuela (1986-89), onde agiam os terroristas Luis Posada Carriles e Orlando Bosch, também da máfia cubana de Miami.

O terrorismo dos dois, ainda hoje sob a proteção do governo Bush, incluiu a trama da Operação Condor para assassinar em Washington o ex-embaixador chileno Orlando Letelier e também o planejamento e execução do atentado que explodiu um avião da companhia Cubana de Aviación e matou 73 passageiros, civis inocentes, inclusive a equipe cubana campeã de esgrima nos Jogos Pan-Americanos.
Posada e Bosch, os exemplos

Os dois atentados foram em 1976, mas Bosch e Posada, ambos treinados pela CIA, dedicavam-se ao terrorismo desde a primeira metade da década de 1960. Fizeram atentados nos EUA e em outros países. Bosch chegou a ser preso na Venezuela, acusado pela explosão do avião cubano, mas fugiu dali para Miami em 1987, com a assistência de Otto Reich, então embaixador dos EUA em Caracas.

A mais recente ação terrorista conhecida de Posada - que agia em vários países do Caribe e América Central - foi no Panamá, em 2000. Acabou capturado e preso ali quando preparava a explosão de uma bomba para matar o líder cubano Fidel Castro, então em visita ao país. Ele e Bosch continuam a viver em Miami - no luxo e na mais completa impunidade. Bosch até recebeu uma vez a chave da cidade das mãos do prefeito.

No caso de Posada, o detalhe insólito de sua história é ter sido infiltrado pela CIA no mais alto cargo da espionagem venezuelana - "chefe de operações de inteligência". Só depois de entrar em choque com algumas autoridades do país, que suspeitavam estar ele fazendo serão como traficante de cocaína, é que foi defenestrado (em 1974) e iniciou a preparação do atentado do avião cubano.

A iniciativa no sentido de enfiar Reich no Departamento de Estado costuma ser atribuída ao vice Dick Cheney, sem respaldo do secretário Colin Powell - a exemplo da de John Bolton. E como o governo percebeu não ter votos suficientes no Senado, devido ao papel de Reich no escândalo Irã-Contras, resolveu nomeá-lo só em caráter precário, em janeiro de 2002, aproveitando o recesso do Congresso.
O fiasco e o repúdio, até de Bush

Reich assumiu e somou-se imediatamente ao complô golpista da Venezuela para derrubar o presidente Hugo Chávez - eleito, reeleito e confirmado em vários plebiscitos. Chegou até a fazer reuniões na Casa Branca com os golpistas, entre eles o empresário Pedro Carmona, que se declarou "presidente" a 11 de abril, fechou o Congresso, cassou os juízes da Suprema Corte e teve de fugir às carreiras dois dias depois.

Ante o fiasco, Reich saiu de cena. Amigos dele na Flórida, como o colunista Andrés Oppenheimer, do "Miami Herald", mobilizaram o "lobby" cubano para forçar sua volta ao cargo a pretexto de ter sido "injustiçado". Mas Bush o deixou circular um tempo na Casa Branca e deu-lhe um "bico" no conselho da infame Escola das Américas, rebatizada mas ainda formando ditadores e torturadores para a América Latina.

Foi o fim da linha para Reich - pelo menos até o desinformado John McCain, na certa depois de ouvir seus próprios lobistas e a máfia cubana de Miami, resolver recebê-lo na campanha. Isso significa que em matéria de América Latina o terceiro mandato de Bush não será apenas "mais do mesmo". Pode até ser pior do que os últimos oito anos. Basta ler as declarações de Reich a "O Globo".
NOTA DA REDAÇÃO - A coluna de ontem está sendo republicada hoje devido à supressão de três parágrafos, o que deixou o texto inconcluso.

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